
Hélio O. Silva = 25/12/2002.
Pródigos! (Lucas 15.11-32)
Quando o meu filho caçula partiu, senti sangrar o corte profundo das palavras que insistiram na partilha da herança antes do tempo e roguei a Deus que o guardasse de todo o mal. Carregando na algibeira o seu futuro em forma de moedas, ele ousou conquistar o mundo. Assim ele desejava, todavia, tudo não passava de fumaça que mais cedo ou mais tarde, levada pelo vento seria. Ele partiu ferindo o meu coração. Mas não deixei morrer a esperança. Ele voltará um dia.
Quando meu filho partiu para uma terra distante partiu meu coração. Ao ver desperdiçar a sua mocidade em sonhos tão tolos e tão passageiros, pedi a Deus que o trouxesse de volta e preparei todos os dias o meu coração para o encontro que certamente chegaria. Muitas vezes levantei meus olhos para o morro distante, onde a estrada encontrava o horizonte e pensei tê-lo ouvido cantarolar as canções que lhe ensinei. Contudo ainda não era o tempo do reencontro. Então esperei; Dias... Meses... Anos... Eu sei que voltará.
Cada dia desejei a sua volta. Cada manhã derramei as minhas lágrimas e de noite não deixei de interceder. Muitas vezes a saudade me conduziu pela mão à beira do desespero e a dor que doía mediu a palmos o meu amor. “_Eu te esperarei meu filho”, pensava; “_ Viverei para te ver chegar. Serão os meus braços que te cobrirão com o perdão e te trarão para dentro de casa; o seu lar seguro. Voltará para seu pai para descansar”.
Eu vi cada dia crescer no coração de seu irmão a mágoa, que ensurdeceu seu coração. Ele trabalhou dobrado no seu lugar. Não adiantou dizer-lhe que não precisava ser assim. Então o vi se afastar de mim. Ele cuidou de mim, mas seu olhar não mais olhava na mesma direção que o meu. Sabia que eu o esperava, e no seu desespero pensou que por não me esquecer do outro, havia-me esquecido dele. Mesmo assim o amei, pois não podia viver pela metade. Eu criei os dois para Deus, sem competição ou cobiça, como me apresentaria diante Dele sem os dois? Desviados pelo caminho, um tão longe e o outro tão perto, não permiti que a cegueira de ambos escurecesse os meus olhos. Desse modo guardei as palavras para o dia do reencontro, de todos nós.
Ninguém o viu chegar antes mim! Sua mãe o viu andar antes mim. Ela também ouviu suas primeiras palavras e entristecida não quis vê-lo partir. Todos se voltaram contra mim porque não o repreendi, porque o deixei partir como quis. O silêncio entristecido de sua mãe que envelheceu rapidamente diante de mim; o silêncio embrutecido de seu irmão que desconheceu o perdão; o meu silêncio esperançoso da sua volta. Eu não os criei para serem meus; eu os criei para serem de Deus e como companheiros quis lhes conduzir a todos pela mão até o Pai. Sei Senhor que me atrasarei. Por favor, espera-me!
Ninguém o viu chegar antes de mim! As lágrimas esperaram pacientemente pelo encontro. Ao vê-lo corri como minhas pernas deixaram. Ele estava tão diferente! Roupas sujas, cabelo desgrenhado; mal cheiroso e emagrecido. Não era mais aquele arrogante robusto e conquistador da partida. Vinha chegando cabisbaixo com um discurso pronto e ensaiado que nunca o deixei terminar. Perdoar é esquecer. O perdão já estava pronto no coração. Por isso corri como nunca ao seu encontro e espremi contra o seu peito a minha saudade. Beijei sua face suja e cansada, medrosa de mim, mas que queria um lugarzinho para repousar, junto de mim, ao lado do pai. Ah! Como é bom recebê-lo de volta ao seu lar!
Não podia e nem queria cobrar a sua desonra. Não podia e nem queria fuzilar o que restara dele com aquelas palavras corretas, mas não para aquele momento. Reencontrei meu filho, ele voltou para a casa que construí com as próprias mãos, suor e lágrimas para protegê-lo do malfeitor.
Então mandei que vestissem nele novamente as roupas que guardei e o restitui à condição de filho que abandonara. O arrependimento estampado na cor de seus olhos suplicantes certamente o trouxeram. Isso é o que importa, o resto se vê depois. Era hora de festejar, que morra o novilho cevado. O meu filho voltou ao lar... Voltou ao lar...
Eu o vi chegar, ao mesmo tempo em que também vi sua mãe sorrir outra vez. Resignada, não interferiu, pois reconhecera finalmente que valia a pena esperar como esperamos. Suas lágrimas eram as mesmas das minhas. Quando enxugou os olhos, lavou o passado.
A seu tempo tratei da ferida reaberta de seu irmão mais velho que também o matou no seu coração como o caçula fizera comigo. Mas porque a minha esperança não me deixou morrer, acreditei que Deus faria o mesmo com seu irmão. Então o busquei de volta, e ele entrou na festa comigo, ao meu lado, como o primogênito deve andar.
Num só dia abracei a todos outra vez porque funcionaram todos os princípios que o Pai me ensinara e que também ensinei à minha esposa e a meus filhos. Num só dia os tomei pela mão para reconduzi-los ao Pai. Agora minha casa está completa. Oh Pai, estou pronto pra chegar!
Com muito amor, Pr. Hélio.