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Aula 05 = A Natureza Constitucional do Homem


Primeira Igreja Presbiteriana de Goiânia-GO
Classe de Doutrina III – O Homem à Luz da Bíblia.
Professores: Pr. Hélio O. Silva e Presb. Josias Correia
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Aula 05 = A NATUREZA CONSTITUCIONAL DO HOMEM 20/03/2011.
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A. Os Elementos Constitutivos da Natureza Humana.
1. DICOTOMIA E TRICOTOMIA.
DICOTOMIA significa entender que o homem consiste de duas partes distintas, e de duas somente: O corpo e a alma. Tricotomis significa entender que a natureza humana consiste de três partes, corpo, alma e espírito.

A TRICOTOMIA originou-se na filosofia grega, que entendia a relação mútua entre o corpo e o espírito do homem segundo a analogia da mútua relação entre o universo material de Deus. Estes só podiam ter comunhão um com o outro por meio de uma terceira substância ou de um ser intermediário. Assim corpo e espírito só podiam manter relações mútuas vitais por meio de um terceiro elemento intermediário, a alma. Por um lado, a alma era considerada como imaterial e, por outro, como adaptada ao corpo. Na medida em que se adapta ao nous ou ao pneuma, era tida como imortal, mas na medida em que se relaciona com o corpo, como carnal e mortal. A mais conhecida, e também a mais crua forma de tricotomia, é a que toma o corpo como a parte material da natureza humana, a alma como o princípio da vida animal, e o espírito como o elemento humano racional, imortal e relacionado com Deus.

A concepção tricotômica do homem recebeu considerável apoio dos “pais” da igreja grega ou Alexandrina dos primeiros séculos da era cristã. Caiu em descrédito depois que Apolinário a empregou de maneira ofensiva à perfeita humanidade de Jesus. Todavia, na igreja latina, a dicotomia recebeu maior apoio. Foi especificamente a psicologia de Agostinho que lhe devolveu a proeminência e durante a Idade Média, o catolicismo a abraçou como crença comum. A Reforma manteve-se aliada ao conceito dicotômico com pouquíssimas excessões. Durante o século dezenove a tricotomia foi revivida numa ou noutra forma por certos teólogos alemães e ingleses, mas, no geral, o conceito da dicotomia prevaleceu. Além dessas duas concepções teológicas, houve também, principalmente no último século e meio, os conceitos filosóficos do materialismo absoluto e do idealismo absoluto, aquele sacrificando a alma em favor do corpo, e este, o corpo em favor da alma.

2. OS ENSINAMENTOS DA ESCRITURA SOBRE A CONSTITUIÇÃO DO HOMEM.
A exposição geral da natureza do homem na Escritura é claramente dicotômica. De um lado, a Bíblia nos ensina a ver a natureza do homem como uma unidade, e não como uma dualidade consistente de dois elementos diferentes, cada um dos quais movendo-se ao longo de linhas paralelas sem realmente unir-se para formar um organismo único. A idéia de um simples paralelismo entre os dois elementos da natureza humana, encontrada na filosofia grega e também nas obras de alguns filósofos posteriores, é inteiramente alheia à Escritura. Embora reconhecendo a complexa natureza humana, ela nunca a expõe como redundando num duplo sujeito no homem. Cada ato do homem é visto como um ato do homem todo. Não é a alma, e sim, o homem, corpo e alma, que é redimido em Cristo.

Esta unidade já acha expressão já no relato da criação do homem Gn 2.7: “Então formou o Senhor Deus ao homem do pó da terra, e lhe soprou nas narinas o fôlego de vida, e o homem passou a ser alma vivente”. Esta obra realizada por Deus não deve ser interpretada como um processo mecânico, como se Ele tivesse formado primeiro o corpo do homem e depois tivesse posto nele uma alma. Quando Deus formou o corpo, formou-o de modo que, pelo sopro do Seu Espírito Santo, o homem se tornou imediatamente alma vivente, Jó 33.4; 32.8. A palavra “alma”, em Gn 2.7, não tem o sentido de a parte abstrata do homem, mas denota um ser vivo, e é a descrição do homem completo. Exatamente a mesma expressão hebraica, nephesh hayyah (alma ou ser vivente) é aplicada também aos animais em Gn 1.21, 24, 30. Assim, embora a passagem indique que há dois elementos no homem, a ênfase recai na unidade orgânica do homem.

Ao mesmo tempo, ela contém igualmente provas da composição dual da natureza humana. Contudo, devemos acautelar-nos quanto a esperar ver no Antigo Testamento a distinção posterior entre o corpo, como o elemento material, e a alma, como o elemento espiritual da natureza humana. Esta distinção entrou em uso mais tarde, sob a influência da filosofia grega. A antítese – alma e corpo – mesmo em seu sentido neotestamentário, não se acha no Antigo Testamento. De fato, o hebraico não tem uma palavra para o corpo como organismo. A distinção veterotestamentária dos dois elementos da natureza humana está na antítese entre o inferior e o superior, o terreno e o celeste, o animal e o divino. Não se trata tanto de dois elementos, mas de dois fatores que se unem, com uma resultante única e harmoniosa – “o homem passou a ser alma vivente”. É evidente que é essa a distinção presente em Gn 2.7 (Cf. Jó 27.3; 32.8; 33.4; Ec 12.7. Várias palavras são empregadas no Antigo Testamento para indicar o elemento inferior do homem ou partes dele, como “carne”, “pó”, “ossos”, “entranha”, “rins”, e também a expressão metafórica de Jó 4.19, “casas de barro”. Há também diversas palavras que indicam o elemento superior, como “espírito”, “alma”, “coração” e “mente”. Tão logo passamos do Antigo para o Novo Testamento, encontramos as expressões antitéticas com que estamos mais familiarizados, como “corpo e alma”, “carne e espírito”. As palavras gregas correspondentes foram, sem dúvida, moldadas pelo pensamento filosófico grego, mas passaram para o Novo Testamento por intermédio da Septuaginta (LXX) e, portanto, retiveram a sua ênfase veterotestamentária. Ao mesmo tempo, a idéia antitética do material e o imaterial atualmente se liga a elas.

Os tricotomistas procuram suporte no fato de que a Bíblia reconhece duas partes constitutivas da natureza humana em acréscimo ao elemento inferior ou material, a saber, a alma (hebraico, nephesh; grego, psyque) e o espírito (hebraico, ruah; grego, pneuma). Mas o uso desses termos com grande freqüência na escritura não dá base para a conclusão de que designam partes componentes, em vez de aspectos diferentes da natureza humana. Um cuidadoso estudo da Escritura mostra claramente que ela emprega as palavras umas pelas outras, em permuta recíproca. Ambos os termos indicam o elemento superior ou espiritual do homem, vendo-o, porém, de diferentes pontos de vista. Contudo, é preciso mostrar logo de início que a distinção que a Escritura faz entre os dois não concorda com o que é mais comum na filosofia, de que a alma é o elemento espiritual do homem, conforme se relaciona com o mundo animal, enquanto que o espírito é o elemento em relação com o mundo espiritual superior, e com Deus.

Os seguintes fatos militam contra essa distinção filosófica: Ruah-pneuma, bem como nephesh-psyque, são empregados com referência à criação animal inferior, Ec 3.21; Ap 16.3. A palavra psyque é empregada até com referencia a Jeová (Is 42.1; Jr 9.9; Am 6.8 (texto hebraico); Hb 10.38). Os mortos desencarnados são chamados psyqai (Ap 6.9; 20.4). Os mais elevados exercícios da religião são atribuídos à psyque (Mc 12.30; Lc 1.46; Hb 6.18, 19; Tg 1.21). Perder a psyque é perder tudo. É mais que evidente que a Bíblia emprega as duas palavras uma pela outra, permutando-as reciprocamente. Observa-se o paralelismo em Lc 1.46, 47: “A minha alma engrandece ao Senhor, e o meu espírito se alegrou em Deus, meu Salvador”. A fórmula escriturística para designar o homem é, nalgumas passagens, “corpo e alma”, Mt 6.25 (psyquê e soma) 10.28; e noutras, “corpo e espírito” (Ec 12.7; 1 Co 5.3, 5). Às vezes a morte é descrita como a entrega da alma (Gn 35.18; 1 Rs 17.21; At 15.26) e também como a entrega do espírito (Sl 31.5; Lc 23.46; At 7.59). Além disso, tanto “alma” como “espírito” são empregados para designar o elemento imaterial do homem (1 Pe 3.19; Hb 12.23; Ap 6.9; 20.4). A principal distinção feita pela Escritura é como segue: a palavra “espírito” designa o elemento espiritual do homem como o princípio de vida e ação que domina e dirige o corpo; ao passo que a palavra “alma” denomina o mesmo elemento como o sujeito da ação no homem e, portanto, muitas vezes é empregada em lugar do pronome pessoal no Antigo Testamento (Sl 10.1, 2; 104.1; 146.1; Is 42.1; cf. Lc 12.19). Em diversos casos, designa mais especificamente a vida interior como a sede dos sentimentos. Isso tudo está em completa harmonia com Gn 2.7, “o Senhor Deus...lhe soprou nas narinas o fôlego de vida, e o homem passou a ser alma vivente”. Assim, pode dizer que o homem tem espírito, mas é alma.

Portanto, a Bíblia indica dois, e somente dois, elementos constitutivos da natureza humana, a saber, corpo e espírito ou alma. Esta descrição escriturística harmoniza-se também com a consciência própria do homem. Enquanto que o homem tem consciência do fato de que consiste de um elemento material e de um elemento espiritual, nenhum homem tem consciência de possuir alma em distinção do espírito.
Há duas passagens que parecem estar em conflito com a descrição dicotômica da escritura: 1 Ts 5.23 e Hb 4.12. Vejamos
a) É boa regra de exegese que as afirmações particulares sejam interpretadas à luz do todo das escrituras.
b) A simples menção dos termos espírito e alma um ao lado do outro não prova que, segundo a escritura, são duas substâncias distintas, como também Mt 22.37 não prova que Jesus considerava o coração, a alma e o entendimento como três substâncias distintas.
c) Em 1 Ts 5.23 Paulo deseja simplesmente fortalecer a afirmação: “O mesmo Deus da paz vos santifique em tudo”, enfatizando os diferentes aspectos da existência do homem, e na qual o apóstolo se sente perfeitamente livre para mencionar os termos alma e espírito um ao lado do outro, porque a Bíblia distingue entre ambos. Ele não poderia ter pensado na alma e no corpo como duas substâncias diferentes, porquanto noutros lugares da Escritura diz ele que o homem consiste de duas partes, Rm 8.10; 1 Co 5.5; 7.34; 2 Co 7.1; Ef 2.3; Cl 2.5.
(d) Hb 4.12 não deve ser entendido no sentido de que a palavra de Deus, penetrando no íntimo do homem, faz separação entre a sua alma e o seu espírito, o que naturalmente implicaria que são duas substâncias diferentes; mas simplesmente no sentido de uma declaração de que ela produz uma separação entre os pensamentos e as intenções do coração.
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Bibliografia: Louis Berkhof. Teologia Sistemática, ECC.

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